De personalidade discreta, o vice-presidente da República, Michel Temer, soltou uma bomba no Planalto com a "carta-desabafo" enviada à presidente Dilma Rousseff na segunda-feira (7).
Além de expressar mágoas por ter sido, desde o primeiro mandato, um mero "vice decorativo", Temer acusa o governo de trabalhar o tempo todo para dividir o PMDB, legenda que ele comanda desde 2001.
A carta em que diz ter "ciência da absoluta desconfiança" de Dilma foi recebida com espanto até por membros da cúpula do partido, que chegaram a classificar a atitude como "infantil". No meio político, a atitude foi interpretada como um rompimento de Temer com a presidente.
"Ele se posicionou como um observador privilegiado e já sinaliza que está disponível caso Dilma sofra o impeachment", avalia o cientista político Leonardo Barreto, da UnB. "A carta surpreendeu demais, e é algo que dificilmente se esperaria de uma pessoa com esse tipo de perfil. Ao mesmo tempo, isso evidencia toda a pressão que ele sofre."
Temer, que pode assumir a Presidência em caso de impeachment se não for barrado num processo no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que pede a cassação tanto da presidente como do vice, foi aplaudido por empresários da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomércio-SP) horas depois de enviar a carta pessoal a Dilma. Ele apresentou o plano Uma Ponte para o Futuro, proposta política do PMDB para os próximos anos e sinal claro de afastamento da legenda em relação ao governo.
O programa partidário criado por Moreira Franco, ex-ministro de Dilma e aliado de Temer, traça o que chama de processo de reunificação do país. "Temer não é vítima, ele flerta muito com essa situação. Esse plano do PMDB é uma mensagem clara", afirma Barreto.
Segundo fontes do partido, a "ponte" do título simboliza o hiato entre um possível afastamento de Dilma e o fim do mandato, em 2018, que pode ser assumido por Temer caso a presidente seja impedida. "Ele já tem preparado esse discurso há algum tempo, por isso que as desconfianças do governo também não são sem motivo", diz Barreto.
Trajetória política
Descendente de libaneses, Temer iniciou a carreira política no governo de Ademar de Barros, na função de chefe de gabinete do então secretário de Educação, Ataliba Nogueira, no início dos anos 1960. Foi eleito deputado constituinte pelo PMDB em 1986, depois de atuar como procurador-geral e secretário de segurança pública em São Paulo.
O paulista de Tietê, no interior de São Paulo, foi eleito deputado estadual por seis mandatos e escolhido para presidir a Câmara em 1997, 1999 e 2009. A experiência política do advogado constitucionalista o consolidou como presidente do PMDB em 2001.
Eleito vice-presidente da República na chapa encabeçada por Dilma em 2010, Temer se tornou a principal peça de articulação do governo com a base aliada. Em 2014, conseguiu unir o partido, apesar de rachas internos, para apoiar Dilma na tentativa de um segundo mandato. Mesmo assim, continuou "de lado" no governo.
"Temer tinha um perfil muito importante para o governo por ter sido presidente da Câmara e ter controle completo do PMDB. Ele tinha muita capacidade de trabalhar na articulação política no Congresso, mas o governo foi extremamente centralizador", diz Barreto.
Temer deixou a articulação política em agosto. Ele tinha assumido a Secretaria de Relações Institucionais em abril para negociar cargos e emendas parlamentares e conseguir aprovar o ajuste fiscal na Câmara e no Senado, com o agravamento da crise entre o Planalto e o Congresso.
"Quando se aprovou o ajuste, nada mais do que fazíamos tinha sequência no governo. Os acordos assumidos no Parlamento não foram cumpridos", reclamou Temer na carta.
Na sequência, o vice comandou uma reunião entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e caciques do PMDB para conseguir apoio do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o principal articulador do impeachment, na análise do pacote de medidas anticrise.
"Nas duas oportunidades foi oferecida a salvação da cabeça de Dilma, mas com a condição de compartilhar mais o poder. Agora, no momento em que a presidente mais precisa, Temer não está mais a postos", analisa Barreto.
As consequências do rompimento
As consequências, diz o especialista, são criar um sentimento de solidariedade a Temer dentro do PMDB e assim unir o partido, que hoje está dividido na Câmara dos Deputados em relação ao processo de impeachment, e despertar o "sentimento de lavagem de roupa suja" em outros partidos da base aliada da presidente.
"Com a carta, foi feito um processo de cobrança pública muito desqualificatório. No centro do poder de decisão, esse é um tipo de coisa que dificilmente acontece, a não ser que se queira que isso seja vazado", explica. A carta pessoal enviada por Temer a Dilma na tarde de segunda-feira chegou à imprensa horas depois.
Temer conclui o texto afirmando que vai manter "cauteloso silêncio" para preservar a "unidade partidária" e que, passados esses "momentos críticos", o país terá "tranquilidade".
"Ele não deve articular ativamente o impeachment, apesar de a carta já ser um grande impulso, mas ele também não vai fazer nenhum esforço para desativar essa bomba", avalia Barreto.
Fonte: dw.com
Além de expressar mágoas por ter sido, desde o primeiro mandato, um mero "vice decorativo", Temer acusa o governo de trabalhar o tempo todo para dividir o PMDB, legenda que ele comanda desde 2001.
A carta em que diz ter "ciência da absoluta desconfiança" de Dilma foi recebida com espanto até por membros da cúpula do partido, que chegaram a classificar a atitude como "infantil". No meio político, a atitude foi interpretada como um rompimento de Temer com a presidente.
"Ele se posicionou como um observador privilegiado e já sinaliza que está disponível caso Dilma sofra o impeachment", avalia o cientista político Leonardo Barreto, da UnB. "A carta surpreendeu demais, e é algo que dificilmente se esperaria de uma pessoa com esse tipo de perfil. Ao mesmo tempo, isso evidencia toda a pressão que ele sofre."
Temer, que pode assumir a Presidência em caso de impeachment se não for barrado num processo no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que pede a cassação tanto da presidente como do vice, foi aplaudido por empresários da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomércio-SP) horas depois de enviar a carta pessoal a Dilma. Ele apresentou o plano Uma Ponte para o Futuro, proposta política do PMDB para os próximos anos e sinal claro de afastamento da legenda em relação ao governo.
O programa partidário criado por Moreira Franco, ex-ministro de Dilma e aliado de Temer, traça o que chama de processo de reunificação do país. "Temer não é vítima, ele flerta muito com essa situação. Esse plano do PMDB é uma mensagem clara", afirma Barreto.
Segundo fontes do partido, a "ponte" do título simboliza o hiato entre um possível afastamento de Dilma e o fim do mandato, em 2018, que pode ser assumido por Temer caso a presidente seja impedida. "Ele já tem preparado esse discurso há algum tempo, por isso que as desconfianças do governo também não são sem motivo", diz Barreto.
Trajetória política
Descendente de libaneses, Temer iniciou a carreira política no governo de Ademar de Barros, na função de chefe de gabinete do então secretário de Educação, Ataliba Nogueira, no início dos anos 1960. Foi eleito deputado constituinte pelo PMDB em 1986, depois de atuar como procurador-geral e secretário de segurança pública em São Paulo.
O paulista de Tietê, no interior de São Paulo, foi eleito deputado estadual por seis mandatos e escolhido para presidir a Câmara em 1997, 1999 e 2009. A experiência política do advogado constitucionalista o consolidou como presidente do PMDB em 2001.
Eleito vice-presidente da República na chapa encabeçada por Dilma em 2010, Temer se tornou a principal peça de articulação do governo com a base aliada. Em 2014, conseguiu unir o partido, apesar de rachas internos, para apoiar Dilma na tentativa de um segundo mandato. Mesmo assim, continuou "de lado" no governo.
"Temer tinha um perfil muito importante para o governo por ter sido presidente da Câmara e ter controle completo do PMDB. Ele tinha muita capacidade de trabalhar na articulação política no Congresso, mas o governo foi extremamente centralizador", diz Barreto.
Temer deixou a articulação política em agosto. Ele tinha assumido a Secretaria de Relações Institucionais em abril para negociar cargos e emendas parlamentares e conseguir aprovar o ajuste fiscal na Câmara e no Senado, com o agravamento da crise entre o Planalto e o Congresso.
"Quando se aprovou o ajuste, nada mais do que fazíamos tinha sequência no governo. Os acordos assumidos no Parlamento não foram cumpridos", reclamou Temer na carta.
Na sequência, o vice comandou uma reunião entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e caciques do PMDB para conseguir apoio do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o principal articulador do impeachment, na análise do pacote de medidas anticrise.
"Nas duas oportunidades foi oferecida a salvação da cabeça de Dilma, mas com a condição de compartilhar mais o poder. Agora, no momento em que a presidente mais precisa, Temer não está mais a postos", analisa Barreto.
As consequências do rompimento
As consequências, diz o especialista, são criar um sentimento de solidariedade a Temer dentro do PMDB e assim unir o partido, que hoje está dividido na Câmara dos Deputados em relação ao processo de impeachment, e despertar o "sentimento de lavagem de roupa suja" em outros partidos da base aliada da presidente.
"Com a carta, foi feito um processo de cobrança pública muito desqualificatório. No centro do poder de decisão, esse é um tipo de coisa que dificilmente acontece, a não ser que se queira que isso seja vazado", explica. A carta pessoal enviada por Temer a Dilma na tarde de segunda-feira chegou à imprensa horas depois.
Temer conclui o texto afirmando que vai manter "cauteloso silêncio" para preservar a "unidade partidária" e que, passados esses "momentos críticos", o país terá "tranquilidade".
"Ele não deve articular ativamente o impeachment, apesar de a carta já ser um grande impulso, mas ele também não vai fazer nenhum esforço para desativar essa bomba", avalia Barreto.