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quarta-feira, 29 de março de 2017

Aos 467 anos, Salvador é cidade sem bairros oficializados por lei


  • IBGE diz que legislação de 1960, que definia 32 bairros, não foi atualizada.
    Projeto de Lei com proposta da UFBA segue sem votação desde 2010.




    Salvador celebra em 2016 o aniversário de 467 anos. Séculos de história não foram suficientes para a implementação e atualização de uma lei que defina os bairros e dê conta das delimitações territoriais da primeira capital do Brasil. Para o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a situação impede a ampla divulgação de dados socioeconômicos e pode repercutir na promoção equivocada de políticas públicas nos territórios soteropolitanos. A Prefeitura de Salvador afirma que um projeto de lei está na Procuradoria Geral do Município (PGM), de onde a redação final será enviada à Câmara de Vereadores. O prazo não foi informado.

    Coordenador de disseminação de informações do IBGE, André Urpia explica que a Lei Municipal Nº 1.038, publicada em 1960, chegou a dividir Salvador em 32 bairros. À época, a população local era de aproximadamente 655.735 habitantes.

    Desde então, até o final de 2015, a capital cresceu e atingiu uma marca de 2,9 milhões de moradores. O progressivo avanço populacional não incitou novas atualizações da norma de 1960, tornando a lei municipal um instrumento ultrapassado e sem utilidade prática.

    “Salvador, oficialmente, não tem bairros, o que dificulta a divulgação de informações. A gente perde dados do censo demográfico e isso é sério. Não há dados oficiais que sirvam de base para promoção de políticas públicas, nem que possam ser divulgados para empresas. Recentemente, o Ministério Público nos perguntou o número de crianças nos bairros para saber quantas precisavam de creches, por exemplo. Oficialmente, não tínhamos”, atesta Urpia.


    'O Caminho das Águas'

    Embora não haja dados oficiais, que sejam amparados por lei, André Urpia destaca que, em 2010, um estudo produzido pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) em parceria com o IBGE e com órgãos vinculados ao estado e ao município resultou em um amplo mapeamento de Salvador.

    Intitulada como “O Caminho das Águas”, a pesquisa identificou a existência de 160 bairros, além de três ilhas, tendo como principal instrumento de análise a sensação de pertencimento narrada por moradores entrevistados em todo o município.

    Vinculados ao critério também foram consideradas questões como oferta de bens e serviços públicos e privados, além de aspectos culturais e de posicionamento geográfico.

    À frente do estudo, Elisabete Santos, professora da Escola de Administração da UFBA, afirma que o intuito inicial da pesquisa era produzir uma análise que trouxesse à tona a qualidade das águas, como também a delimitação das bacias hidrográficas e de drenagem de Salvador.

    “Nesse projeto, sentimos de forma intensa a desconexão dos cidadãos com águas. As pessoas não diziam que estavam integradas a uma determinada bacia [hidrográfica], mas a um bairro. Precisávamos dessa ideia de identidade e acabamos articulando os bairros e bacias”, explica Elisabete sobre os rumos da pesquisa.

    O estudo foi divulgado em 2010 e, segundo a professora, gerou como subproduto um projeto de lei que, enfim, propunha a definição de bairros em Salvador. Ela conta que o documento foi entregue à Prefeitura Municipal, que na época era comandada por João Henrique. Desde então, o projeto não foi encaminhado para votação na Câmara de Vereadores.


    Derrubando mitos

    Quando o estudo “O Caminho das Águas” foi divulgado, Joílson Rodrigues de Souza, que hoje atua como assessor na Pró-Reitoria de Planejamento e Orçamento da UFBA, exercia o cargo de coordenador de disseminação de informações do IBGE. Ele conta que a falta de avanço do projeto de lei impede que a capital baiana dê um passo importante em uma identificação mais precisa das necessidades dos moradores.

    “Toda vez que a comunidade demanda algo da prefeitura, parte de algum argumento para fazer válida a demanda. Se o bairro não conhece realmente qual é a sua população, pode ter suas necessidades subestimadas ou superestimadas”, pondera Souza.

    Em 2012, por exemplo, o IBGE divulgou dados que derrubaram alguns mitos relacionados a Salvador. Um deles é referente ao bairro mais populoso, que até então acreditava-se que era Cajazeiras, com mais de 300 mil habitantes. O censo demográfico apontou que, na verdade, a região conta com 60 mil moradores. A pesquisa atesta que o bairro de Brotas é o mais habitado da capital, com 70.158 pessoas.

    Também contrariando o pensamento popular, o censo demográfico indicou que a Liberdade não é o bairro com o maior número de pessoas negras da cidade. Em números absolutos esse título é do bairro de Pernambués, onde, de acordo com o IBGE, moram 53.580 negros. Ainda segundo a pesquisa, a Liberdade não está nem entre os cinco bairros com maior número de pessoas negras em Salvador.

    “Seja para atuação do poder público, seja para o cidadão promover reivindicações, é importante que tenhamos definidos os nossos limites geográficos”, defende Joílson Rodrigues de Souza. Ele acrescenta que alguns municípios do interior da Bahia já avançaram neste quesito ao aprovarem leis que definem bairros, como Lauro de Freitas e Camaçari. Além disso, a expectativa é de que Feira de Santana, Vitória da Conquista e Itaberaba já tenham dados específicos sobre bairros divulgados no próximo Censo, em 2020.

    “Uma vez definidos os bairros, os entes geográficos (população, saneamento, escolaridade, etc) terão acompanhamento sistemático a cada Censo”, conclui Souza sobre a importância de votação e aprovação do projeto de lei que define os bairros de Salvador.

    A professora Elisabete Santos defende que a definição de bairros deve auxiliar a administração municipal e acompanhar a dinâmica de crescimento do município. "A lei de bairro é fundamental do ponto de vista de gestão de território. Agora, ela não pode ser engessada, porque a cidade é dinâmica", destaca sobre a necessidade de atualização permanente das informações.


    Cultura dos bairros

    A aprovação do projeto de lei que define e delimita os bairros de Salvador pode tirar dúvidas de muitos cidadãos soteropolitanos. A pesquisa “O Caminho das Águas”, por exemplo, aponta que o Curuzu é um bairro à parte da Liberdade.

    Joílson Rodrigues de Souza, que era coordenador de disseminação de informações do IBGE no período da divulgação do estudo, em 2010, disse que a decisão foi tomada privilegiando aspectos culturais da região. “O Curuzu tem uma representação muito forte de natureza cultural, que provoca aspectos muito próprios. Isso eleva sua condição para bairro”, explica.

    A aposentada Maria Ângela, que mora há mais de 30 anos no Curuzu, tinha outro entendimento. “Curuzu não é um bairro. É uma transversal do bairro da Liberdade. O destaque que temos tem a ver com presença da sede do Ilê Ayiê [bloco afro], que fica aqui”, pontua.

    Brotas, bairro mais populoso de Salvador, também é uma localidade que provoca dúvidas geográficas. O encarregado de montagem Jorge de Jesus Ferreira mora há 15 anos no Candeal. Ele acredita que o local é uma área de Brotas. “Quando preciso dar o meu endereço a alguém, eu digo que moro no bairro de Brotas e que a minha casa fica na região do Candeal", detalha Ferreira.

    Para a pesquisa “O Caminho das Águas”, Candeal já é um bairro. “Foi analisada a centralidade da região e os equipamentos [públicos e privados] que ela agrega”, conta Joílson Rodrigues de Souza.

    Projeto de Lei

    Reinaldo Braga Filho, diretor geral das prefeituras-bairro de Salvador, afirma que a pesquisa “O Caminho das Águas” já é usada como referência de atuação da atual gestão municipal. “A gente já utiliza essa divisão [apontada pelo estudo], falta o detalhe que é aprovar o projeto de lei”, relata.

    Braga Filho destaca que a divisão do município em 160 bairros e três ilhas foi referência na definição das 10 prefeituras-bairro implantadas em Salvador, desde 2014. São elas: Centro-Brotas; Barra-Pituba; Cabula-Tancredo Neves; Liberdade-São Caetano; Cidade Baixa; Subúrbio e Ilhas; Regional de Valéria; Pau da Lima; Cajazeiras; e Itapuã-Ipitanga.

    “Quando chegamos aqui, nos deparamos com essa situação [da ausência de lei sobre bairros]. Verificamos na Câmara de Vereadores e na prefeitura se já exista algum projeto em andamento. Tivemos então acesso ao estudo ‘O Caminho das Águas’. A Prefeitura admite que se trata do retrato mais fiel da cidade de Salvador”, atesta Braga Filho.

    Usado como referência para definição das prefeituras-bairro, o projeto de lei criado por meio da pesquisa “O Caminho das Águas” ainda segue na prefeitura. “O projeto de lei está pronto na procuradoria do gabinete do prefeito. A gente não fez nenhuma alteração. Agora só falta parte legal, que é votação e aprovação”, estima Braga Filho.

    Por meio de nota, a Prefeitura de Salvador confirmou que o projeto de lei está na Procuradoria Geral do Município (PGM). A Prefeitura acrescenta que o texto vai atualizar a Lei Municipal 1.038/60 e, sendo aprovada pelos vereadores, definirá que Salvador passa oficialmente a possuir 163 bairros, estabelecendo os limites geográficos de cada um, assim como proposto pelo estudo "O Caminho das Águas".


    Bairros identificados no estudo 'O Caminho das Águas':

    Acupe
    Aeroporto
    Águas Claras
    Alto da Terezinha
    Alto das Pombas
    Alto do Cabrito
    Alto do Coqueirinho
    Amaralina
    Areia Branca
    Arenoso
    Arraial do Retiro
    Bairro da Paz
    Baixa de Quintas
    Barbalho
    Barra
    Barreiras
    Barris
    Beiru/Tancredo Neves
    Boa Viagem
    Boa Vista de Brotas
    Boa Vista de São Caetano
    Boca da Mata
    Boca do Rio
    Bom Juá
    Bonfim
    Brotas
    Cabula
    Cabula VI
    Caixa D'Água
    Cajazeiras II
    Cajazeiras IV
    Cajazeiras V
    Cajazeiras VI
    Cajazeiras VII
    Cajazeiras VIII
    Cajazeiras X
    Cajazeiras XI
    Calabar
    Calabetão
    Calçada
    Caminho das Árvores
    Caminho de Areia
    Campinas de Pirajá
    Canabrava
    Candeal
    Canela
    Capelinha
    Cassange
    Castelo Branco
    Centro
    Centro Administrativo da Bahia
    Centro Histórico
    Chapada do Rio Vermelho
    Cidade Nova
    Comércio
    Cosme de Farias
    Costa Azul
    Coutos
    Curuzu
    Dom Avelar
    Doron
    Engenho Velho da Federação
    Engenho Velho de Brotas
    Engomadeira
    Fazenda Coutos
    Fazenda Grande do Retiro
    Fazenda Grande I
    Fazenda Grande II
    Fazenda Grande III
    Fazenda Grande IV
    Federação
    Garcia
    Graça
    Granjas Rurais Presidente Vargas
    IAPI
    Ilha de Bom Jesus dos Passos
    Ilha de Maraé
    Ilha dos Frades
    Imbuí
    Itacaranha
    Itaigara
    Itapuã
    Itinga
    Jaguaripe I
    Jardim Armação
    Jardim Cajazeiras
    Jardim das Margaridas
    Jardim Nova Esperança
    Jardim Santo Inácio
    Lapinha
    Liberdade
    Lobato
    Luiz Anselmo
    Macaúbas
    Mangueira
    Marechal Rondon
    Mares
    Massaranduba
    Mata Escura
    Matatu
    Monte Serrat
    Moradas da Lagoa
    Mussurunga
    Narandiba
    Nazaré
    Nordeste de Amaralina
    Nova Brasília
    Nova Constituinte
    Nova Esperança
    Nova Sussuarana
    Novo Horizonte
    Novo Marotinho
    Ondina
    Palestina
    Paripe
    Patamares
    Pau da Lima
    Pau Miúdo
    Periperi
    Pernambués
    Pero Vaz
    Piatã
    Pirajá
    Pituaçu
    Pituba
    Plataforma
    Porto Seco Pirajá
    Praia Grande
    Resgate
    Retiro
    Ribeira
    Rio Sena
    Rio Vermelho
    Roma
    Saboeiro
    Santa Cruz
    Santa Luzia
    Santa Mônica
    Santo Agostinho
    Santo Antônio
    São Caetano
    São Cristóvão
    São Gonçalo
    São João do Cabrito
    São Marcos
    São Rafael
    São Tomé
    Saramandaia
    Saúde
    Sete de Abril
    Stella Maris
    STIEP
    Sussuarana
    Tororó
    Trobogy
    Uruguai
    Vale das Pedrinhas
    Vale dos Lagos
    Valéria
    Vila Canária
    Vila Laura
    Vila Ruy Barbosa/Jadim Cruzeiro
    Vitória
    Fonte: G1

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